sábado, 18 de janeiro de 2014

Vaticano recebe 600 denúncias contra padres que abusam de menores por ano



O Vaticano admitiu nesta quinta-feira (16) a existência de clérigos e funcionários da Igreja Católica que abusaram sexualmente de menores. A sessão de ontem foi considerada histórica porque foi a primeira vez que uma delegação do Vaticano deu explicações sobre os abusos aos especialistas do Comitê para os Direitos da Infância da ONU.

Muitas dúvidas, no entanto, ainda seguem no ar, segundo as organizações que reúnem as vítimas: Quantos menores foram abusados pelos religiosos? O que aconteceu com os 4.000 casos que a própria igreja vem investigando? E, o mais importante: Os casos serão levados à polícia e os criminosos serão responsabilizados penalmente?

A sessão de ontem se concentrou justamente nas punições contra os religiosos responsáveis por ocultar os casos, além de medidas para proteger de maneira eficaz as crianças sob custódia ou influência de religiosos.

Vários membros do comitê — composto por 18 especialistas em direitos humanos — pediram números concretos sobre os casos que o Vaticano teve conhecimento, assim como o número de sacerdotes julgados por abusar de menores ou por ocultar tal delito.

Em mais de cinco horas de reunião, a única referência a números foi feita pelo monsenhor Silvano Tomasi, embaixador do Vaticano na ONU em Genebra, sede do comitê que defende os direitos da infância.

Tomasi informou que, em 2012, o Vaticano documentou 612 casos de abuso sexual que envolviam funcionários do clero. Desse total, "465 eram mais sérios" e "418 foram abusos de menores".

O Vaticano afirma que continua recebendo cerca de 600 denúncias contra sacerdotes todos os anos, muitas delas sobre incidentes cometidos nas décadas de 1960, 1970 e 1980.

No entanto, organizações civis que representam as vítimas afirmam que, só nos Estados Unidos, foram registrados mais de 100 mil casos desde a década de 1960. Isso sem contar que, em países como a Irlanda, "este tipo de violência era sistemática", comentou a jurista Pam Spees, do Centro sobre Direitos Constitucionais dos Estados Unidos.

Segundo as pesquisas e dados coletados por esta entidade, "é possível que se trate de centenas de milhares de vítimas".

As investigações da própria igreja

Outro problema enfrentado pelo Vaticano se refere às 4.000 denúncias que estão sendo analisadas pela Congregação para a Doutrina da Fé. Em dezembro, a Santa Sé se recusou a responder a um questionário sobre tais investigações enviado em julho pelo comitê da ONU.

Como o problema se arrasta sem resposta, as associações das vítimas acusam o Vaticano de acobertar os clérigos criminosos e de dificultar as investigações.

Essas acusações, no entanto, foram negadas por Tomasi.

— Esta denúncia me parece um pouco privada de fundamento. A Santa Sé apoia o direito e o dever de cada país de julgar os crimes contra os menores. A crítica de que está tentando interferir, obstruir, não se sustenta. Pelo contrário, queremos que haja transparência e que a igreja siga seu curso.

A presidente da Rede de Sobreviventes de Abusos por Sacerdotes (SNAP, na sigla em inglês), Bárbara Blaine, considerou que o Vaticano realmente não mudou a maneira de abordar o assunto.

— Se o Vaticano fosse sincero, teria mencionado dois pontos-chave: o de que está fornecendo provas à polícia; e que está punindo padres que esconderam esta situação. Mas, por enquanto, falharam em ambos os aspectos.

"O Vaticano afirma que só tem jurisdição sobre 30 crianças da Cidade do Vaticano, mas uma coisa é a soberania territorial e outra é a área de influência. Há milhões de católicos no mundo e, obviamente, o papa tem alguma influência sobre eles", disse Miguel Hurtado Calvo, ativista em favor das vítimas de abuso, assim como ele.

Segundo Hurtado, faltam medidas mais concretas do Vaticano, porque tudo o que foi feito até agora não surtiu efeito.

Hurtado, que é o porta-voz em espanhol da SNAP, cita um documento de 1986 emitido pelo Vaticano e que condenava os abusos.

— Quando esse relatório foi escrito, eu tinha quatro anos de idade. Quando eu fui abusado, eu tinha 16. Eles [o Vaticano] tiveram 12 anos para resolver o problema. Eles tiveram 12 anos para implantar medidas. Eles tiveram 12 anos, nos quais não fizeram absolutamente nada.

 G1

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