sábado, 5 de abril de 2014

'Câncer não espera', diz mãe de garoto que morreu aguardando medula


Marcos Luiz, de 9 anos, morreu de leucemia na última quarta-feira (2).
Duas semanas antes da morte, doador compatível desistiu de ajudar.


Mônica Andrea pretende lutar pela conscientização da importância da doação de medula óssea (Foto: Fernanda Zauli/G1)

Transformar a dor em luta. É isso o que pretende fazer Mônica Andrea Xavier, de 32 anos, mãe do pequeno Marcos Luiz de Sousa Filho, de 9 anos, que morreu de leucemia na última quarta-feira (2), em Natal. "Meu filho se foi, mas eu vou lutar para que outras mães não passem por isso", disse. Marcos estava internado no Hospital Varella Santiago aguardando o transplante de medula. Um doador compatível foi encontrado, mas, quinze dia antes da morte da criança, desistiu de doar.


Foi então que, em meados de março, Mônica recebeu a notícia de que o doador desistiu da doação. “Quando eu recebi a notícia da desistência do doador eu vi que estava perdendo um pouquinho do meu filho. Primeiro veio a revolta, depois o desejo de tentar entender, e em seguida o desespero. E agora? O que fazer? É o chão que se abre, a gente fica sem rumo”, disse. Agora, Mônica quer trabalhar para conscientizar as pessoas sobre a importância da doação de medula óssea e lutar para que o poder público atue com mais agilidade nesse processo.
Marcos Luiz recebeu o diagnóstico de leucemia em dezembro de 2012, quando ainda tinha 7 anos. De acordo com Mônica, ele fez seis meses de quimioterapia e foi dado como curado, mas, em outubro de 2013, teve uma recaída. “A doença voltou e ele logo foi encaminhado para a fila do transplante. Em janeiro deste ano encontraram um doador compatível. Nós corremos contra o tempo para fazer todos os exames e deixar o Marquinhos apto a fazer o transplante”, contou.
Marcos Luiz, de 9 anos, morreu na últim quarta-feira (2) (Foto: Arquivo pessoal)Marcos Luiz, de 9 anos, morreu na últim quarta-feira
(2) (Foto: Arquivo pessoal)
“O câncer não espera. Temos dias contados. A morosidade e a burocracia no processo da doação pode ser definitiva para a vida de alguém”, disse Mônica. Para encampar essa luta ela conta com o apoio da Associação de Humanização e Apoio ao Transplantado de Medula Óssea no RN (Hatmo). A presidente da Hatmo, Rosali Cortez, explica que no Brasil não há esclarecimento e apoio suficiente aos possíveis doadores. Segundo ela, em outros países, os doadores recebem uma ajuda de custo para a realização de exames. “Quando a pessoa é compatível com alguém ela precisa fazer vários exames para saber se o estado de saúde permite que ela doe. Esses exames, no Brasil, são feitos pelo Sus ou por conta do doador. Não há uma ajuda e há custos. Se for uma pessoa humilde, que não tem carro, por exemplo, tem o custo da locomoção, de um lanche, e tudo corre por conta do doador”, disse Rosali.
Mônica Andrea acredita que também falta apoio psicológico ao doador. “Se uma pessoa tem morte cerebral, por exemplo, rapidamente assistentes sociais e psicólogos começam a atuar junto aos familiares para que os órgãos sejam doados. Por que isso não é feito também com um possível doador? Por que quando uma pessoa é comunicada de que é compatível com alguém que precisa de medula óssea não é feito um trabalho de conscientização? A medula óssea também é vital. Por que não dão a mesma importância?”.
A maior razão para a desistência ainda é o medo"
Rodrigo Villar, hematologista
Não há estatísticas no Brasil sobre a desistência de possíveis doadores, mas, de acordo com o diretor do Departamento de Hemoterapia do Hemocentro, Rodrigo Villar, é mais frequente do que se imagina. “Acontece mais do que se imagina e, infelizmente, por causa da desinformação. A maior razão para a desistência ainda é o medo”, disse.
Ele explicou que o primeiro passo para quem pretende ser um doador de medula óssea é se cadastrar no Hemocentro. Quando é compatível com alguém, o possível doador tem que fazer exames para saber se está bem de saúde e apto a doar. O transplante pode ser feito de duas formas. A mais comum, segundo ele, é por meio de uma punção da medula óssea. O procedimento é realizado no centro cirúrgico, com anestesia geral. “É simples. Não podemos dizer que o risco é zero porque envolve um procedimento cirúrgico, mas é um risco mínimo. O doador terá alta em um ou dois dias e poderá ficar com um certo desconforto no local da punção, mas é uma dor que pode ser resolvida com um analgésico. A dor é irrisória perante o benefício que o doador estará fazendo para a vida de alguém”, disse o médico.
O hematologista Rodrigo Villar explica que os riscos são mínimos para o doador (Foto: Fernanda Zauli/G1)O hematologista Rodrigo Villar explica que os riscos
são mínimos para o doador
(Foto: Fernanda Zauli/G1)
O outro procedimento é realizado por uma máquina que faz a coleta de sangue periférica. O doador toma uma medicação que fará com que as células tronco migrem para a corrente sanguínea. "A máquina então coleta o sangue, centrifuga o sangue e separa o componente celular que eu preciso", explicou o médico.
“Quem tem a oportunidade de doar a medula óssea está sendo agraciado, abençoado, porque está tendo a oportunidade de restaurar, de salvar uma vida”, disse Rodrigo Villar.

G1 RN

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